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29 Dec 2010

Turismo para recreio em espaços silvestres

http://naturlink.sapo.pt/article.aspx?menuid=10&cid=23592&bl=1&viewall=true#Go_1
Por Nuno Leitão, Naturlink

Perspectiva ecológica do uso dos espaços silvestres para recreio. Uma breve reflexão sobre os impactos e a gestão do turismo na natureza.

As actividades de recreio em espaços silvestres são, de uma forma geral, causadoras de perturbações no meio em causa, mas os impactos resultantes de cada actividade poderão diferir em maior ou menor grau. Potencialmente e de forma interrelacionada, estas actividades, afectam o solo, a vegetação, os animais e a água, podendo algumas actividades afectar a componente geológica e o ar. Os impactos não ocorrem de forma isolada, actividades específicas podem ter efeitos múltiplos, e desta forma as soluções de gestão não se poderão cingir a um único efeito, uma vez que a solução de um problema poderá ser a causa de outros consequentes.

O impacto nos solos resultantes do pisoteio inicia-se com a destruição de horizontes orgânicos e por compactação. Estes impactos vão alterar características básicas dos solos como o arejamento, temperatura, infiltração de água e concentração de nutrientes, tendo consequências na vida que se apoia no solo como substrato, como sejam a maioria das plantas terrestres e a fauna do solo, e implicando consequências secundárias em toda a vida que depende dos primeiros. O próprio solo será alvo de consequências secundárias, com a diminuição de organismos vivos que lhe possibilitariam uma melhor estrutura. Estes efeitos são facilmente notados em locais de campismo, devido principalmente à compactação que origina.

A diminuição da taxa de infiltração de água, determina um maior escoamento superficial das águas da chuva, que leva à erosão do solo (refira-se que na nossa região a erosão hídrica é muito significativa, ao contrário da erosão eólica). A erosão do solo pode ser severa a ponto de este se perder em determinados locais, ficando a descoberto a rocha mãe. Estes efeitos acentuados da erosão hídrica do solo, são muitas vezes evidentes em caminhos de veículos com o solo muito compactado. Note-se que em caminhos florestais, em florestas fechadas, a erosão acentuada nesses troços deve-se também à estrutura proporcionada pelas árvores. Estas levam à concentração das águas de escoamento nos locais sem coberto florestal, nomeadamente nos caminhos, erosionando-os, erosão essa que é agravada pela compactação do solo nesses locais.

 O pisoteio ou outros factores resultantes das actividades de recreio afectam também, directamente, a vegetação. Estas actividades diminuem o coberto vegetal, a sua capacidade reprodutiva e a sua taxa de crescimento. Nas árvores, em particular, estes impactos poderão alterar a estrutura etária dos povoamentos, quando implicam uma diminuição acentuada do processo reprodutivo. As árvores são também sujeitas a acções que lhes provocam lesões, levando à diminuição da sua resistência a agentes físicos e bióticos.

A perda da vegetação tem, por sua vez, efeitos no solo, como sejam a perda de matéria orgânica, com todos os seus efeitos na estrutura e fertilidade do solo, a perda de protecção contra a erosão hídrica, e a perda radicular também essencial para a estrutura do solo.

Quando falamos das alterações da vegetação estamos também a referir as alterações do habitat dos animais. Para os animais maiores, os impactos directos, podem ser muito significativos, nomeadamente em situações de diminuição da reprodução, como os casos das aves que abandonam os seus locais de nidificação. Registam-se, por outro lado, adaptações alimentares como a recorrência a depósitos de lixo por parte dos animais, o que pode levar a crescimento populacionais indesejáveis de espécies oportunistas, como as gaivotas ou mesmo raposas.

As alterações de habitat, desencadeiam consequências tanto para os animais de maior porte como para os animais mais pequenos como os insectos que dependem da matéria orgânica depositada no solo. Muitos destes animais, desempenham um papel fundamental com os seus efeitos no solo e na vegetação, pela posição que ocupam nos ciclos de nutrientes e de energia no ecossistema.

A qualidade da água poderá ser reduzida com aumentos de deposição de nutrientes ou mesmo poluentes, podendo-se verificar situações de eutrofização das massas de água. A erosão dos solos, poderá levar a aumentos consideráveis da sedimentação, e pode mesmo ocorrer, em locais de recreio, uma contaminação patogénica resultante de desperdícios impropriamente depositados. As águas eutrofizadas com menores quantidades de oxigénio dissolvido, apresentam uma comunidade biológica bastante alterada e pouco atractiva para o visitante.

Uma vez considerada a importância ecológica dos impactos resultantes das actividades de recreio, pode-se ficar com a noção de que mais valeria a pena manter as áreas silvestres sem uso turístico. Esta posição demonstra-se, no entanto, irreal e pouco interessante. O turismo é, e cada vez tende a ser mais, uma indústria poderosa que pode ser o garante económico dos ecossistemas que se pretende conservar, assim como o pretexto para criação ou recuperação de novas zonas silvestres. Do ponto de vista ecológico, estes impactos podem perder o seu significado aparentemente catastrófico, porque podem ser medidos e minimizados. Conforme os objectivos pretendidos, poder-se-ão estabelecer quais as alterações do meio que são positivas e quais as que são negativas, estabelecendo uma estratégia de exploração turística sustentada das áreas em causa.

A gestão dos espaços silvestres, terá de ser direccionada para o encontro de equilíbrios, de forma a que os impactos sejam minimizados, onde as pessoas, enquanto visitantes, são parte do ecossistema. É necessário que quem gere as áreas sujeitas a procura turística de natureza não "mate a galinha dos ovos de ouro", levando à degradação desses locais por excesso de uso, o que levaria, por sua vez, à diminuição da sua procura. Por exemplo, passeios pedestres em zonas sensíveis de dunas podem levar à degradação da vegetação e das próprias dunas, se não forem construídas passadeiras e se evite que as pessoas se desloquem erraticamente. É fundamental uma atitude atenta, que corrija eventuais excessos e que sejam garantidas as infraestruturas indispensáveis para minimizar impactos negativos, caso contrário podem ser as pessoas que amam a natureza a principal causa da sua degradação.