O Algarve de Sotavento a Barlavento
Por: Uwe Heitkamp (52) , jornalista, guia e formador. Vive desde 1990 em Monchique. É fundador do jornal semanal trilingue Algarve123.
A Via Algarviana começa na fronteira com Espanha, em Alcoutim, e é a rota pedestre mais empolgante a sul da Europa. Na fronteira entre Andaluzia e o Algarve, delimitada pelo rio Guadiana, fica o concelho de Alcoutim, um pequeno ninho, completamente adormecido, no lado português. Aí come-se verdadeiramente bem, pode-se descansar com tranquilidade e acompanhar o curso das águas, que 50 quilómetros mais adiante para sul, correm para o Atlântico.
Daqui vamos serpenteando por veredas, colinas e vales, por ribeiras e montes. Ao longe, a sul, fica o litoral e o rebuliço do turismo. E vamos a isso: a cada dia cerca de 25 km. Passamos por pequenas aldeias, onde a agricultura tradicional ainda conta para algo. E se começar a sentir as suas pernas a implorarem “ajuda, não aguento mais”, é porque já não falta muito para chegar à próxima hospedaria. Cada dia um pouco. Num total de cerca de 340 quilómetros. Refira-se que esta travessia não é para “ovos-moles”. De certa forma, convém que já tenha feito outras caminhadas antes, e que possua as botas adequadas para o efeito, especialmente para as subidas na serra. A chegada ao Cabo de São Vicente, a parte mais a sudoeste da Europa, onde as ondas do Atlântico marulham nas falésias, acontece ao fim de treze a catorze dias. É aqui que termina o mundo e a Via Algarviana. No oceano. Na praia.
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Em Portugal tudo dura sempre mais algum tempo. É como na Bela Adormecida. Às vezes isso até é bom. Pois a natureza permanece intocada. Hoje, depois de doze anos de planeamento, esta rota longa está quase sempre sinalizada, embora às vezes ainda haja alguns caminhantes que se perdem do caminho. Pode ser que os caçadores tenham removido dali os sinais, que os tenham mudado de posição para nos pregarem uma partida, ou que tenham virado ao contrário as pedras sinalizadas. Muito recentemente, dois gringos do Texas foram percorrrer a Via Algarviana e não acharam nada divertido andarem dois dias inteiros em círculo. Fizeram o resto do caminho de autocarro. Para desgosto de todos. O caçador é o inimigo natural do caminhante em Portugal. Ainda bem que na época primaveril (de Janeiro a Junho) os caçadores não podem andar aos tiros por aí, pois é tempo dos animais procriarem e é proibido por lei caçar. É por isso muitas vezes vantajoso percorrer a Via Algarviana com um guia. Porque ele não só conhece bem os trilhos, como também conhece os habitantes. Há 20 anos que vivo na serra algarvia, sou jornalista de profissão e guia – e tenho várias histórias verídicas e fictícias para partilhar consigo...
Outra coisa que também faz parte de uma caminhada é a logística. Hoje em dia, os caminhantes já não morrem por falta de mantimentos como antigamente em que a cada par de quilómetros encontrávamos alguém faminto à beira do caminho. A Via Algarviana já era percorrida por peregrinos no século IV, até Cabo de São Vicente, em devoção ao Santo. Portugal é membro da União Europeia desde 1986 e, entretanto, foi bem guarnecido. Hoje, já não se coloca mais a questão “onde comer e dormir bem, mas sim o que comemos e como dormimos”. Hoje, para satisfação da maioria, existe resposta para estas questões. Se quiserem, já não têm que dormir ao relento, e já não precisam de andar com tendas ou sacos-cama às costas. Existem hospedarias com quartos de solteiro e de casal e bons colchões. E para comer há não só o quanto baste, como também existe uma oferta de pratos típicos caseiros, o que significa que eu irei testar convosco a gastronomia local. Há pão fresco com queijo e chouriço, doce e mel praticamente todas as manhãs. E como é natural, ao longo da Via Algarviana iremos também de hospedaria em hospedaria. Porém, pelo menos uma vez durante a travessia serei eu a cozinhar para vós.
É fabuloso percorrer a Via Algarviana na Primavera! Depois do florescer das amendoeiras, das laranjeiras e das mimosas, e após as chuvas abundantes de Inverno, o sol de Primavera mergulha a paisagem num mar de cistos; as ervas aromáticas perfumam a atmosfera; sopra uma brisa suave. Vemos águias, lontras, raposas, fuinhas e outros animais selvagens. Caminhamos por entre florestas de sobreiros; descansamos debaixo dos pinheiros mansos. E se quiser, plante você próprio uma árvore e deixe a sua marca no projecto de reflorestação. Na Páscoa encontra na Via Algarviana a atmosfera ideal que lhe irá ficar para sempre na memória. Fica um aviso: não é aconselhável percorrer a Via Algarviana no Verão. Pois o sol queima-lhe na cabeça. E a época é não só demasiado quente, ou melhor, demasiado seca, como também é muito poeirenta e constitui um risco enorme de incêndio. E além disso, leve também consigo um amigo, ou até mesmo um guia.
E mais uma coisa: a Via Algarviana não é para turistas que querem caminhar até ao café mais próximo. É indispensável uma boa mochila, que não deve pesar (cheia) mais de 8-10 kg. E é sempre uma vantagem trazer, além da água, também um sortido de frutos secos no bolso. Leia, por isso, o que mais deve levar na sua mochila. Divirta-se...
São indispensáveis para a Via Algarviana: botas impermeáveis, uma mochila com itens de protecção contra a chuva, chapéu, óculos de sol, protector solar, bastão, garrafa de água, lanterna, bússola, telemóvel e carregador solar da bateria, kit de primeiros socorros, fato de banho, toalhas, produtos de higiene pessoal, sandálias, canivete, apito.
Mais informações: email: info@via-algarviana.com